Category: Estilo de Vida

  • Casualização sartorial

    Casualização sartorial

    Um negócio interessante que notei de meados dos anos 2000 pra hoje é a irônica contradição do vestir masculino. Você vê, cada vez menos temos a obrigação social de usar roupas formais ou de alfaiataria (que não são a mesma coisa, aliás). O vestuário masculino está cada vez mais flexível e sem regras: a maior parte de nós pode vestir quase o quê quiser no dia-a-dia. Com a mudança de muitos para o trabalho home office, isso se torna uma tendência ainda mais forte. Porém…

    Uma boa parte de nós decidiu usar alfaiataria. Uma quantidade grande de homens (em particular das duas gerações mais novas) escolhe usar “roupa social”, sem obrigação nenhuma. Apesar dos incontáveis artigos declarando “a morte do costume” (só procurar na internet que vai encontrar), eventos como Pitti Uomo crescem ano a ano, blogs como este e tantos outros surgem, e as vendas de roupas de alfaiataria masculina continuam firmes e fortes. Por quê esta aparente contradição?

    Falando pela minha experiência e o quê notei vindo de amigos e clientes: agora que não somos forçados a colocar terno costume e gravata, estamos encarando estas peças com um olhar menos tendencioso. Não existe mais uma aversão a usar estas roupas que tínhamos quando elas eram forçadas socialmente, então podemos vê-las e avaliá-las com a mente aberta. Somos como crianças cujos pais queriam forçar a fazer alguma coisa, até que em determinado momento eles desistiram… e aí fomos e fizemos a coisa por vontade própria. Você não queria comer alface porque sua mãe tava te forçando. mas agora que ela parou, “Hey, até que a textura é boa! E fica bom com sal e limão!”.

    Então o quê vemos são duas gerações onde usar estas roupas se tornou uma escolha consciente. Eu posso ir no bar e encontrar um amigo que vestiu uma gravata e um colete DEPOIS que saiu do serviço, porque ele curte o visual. Chego na festa e um camarada tá usando suspensório porque achou legal quando viu num filme e comprou um pra experimentar.

    Roupas de alfaiataria deixaram de ser uma imposição de se conformar ao resto da sociedade, e voltaram a ser o quê eram há muito tempo atrás: uma forma de expressão pessoal.

    E eu acho isso muito legal!

  • La passeggiata

    La passeggiata

    Estava relendo o ótimo livro I Am Dandy: The Return of the Elegant Gentleman recentemente. O livro é um compilado de perfis de dândis contemporâneos, e um dos meus preferidos é o de Gay Talese. Nessa entrevista, o lendário repórter (e provavelmente o jornalista mais bem vestido do mundo) conta sobre uma certa “passeggiata”.

    “Mas o quê é uma ‘passeggiata’?”, você pergunta?

    É um hábito e passatempo italiano, que literalmente significa “caminhada” ou “passeio”. Mas é um pouco mais que só um passeio…

    Lá na Itália, é costumeiro de fim de semana as pessoas saírem para a praça central da cidade (ou avenida mais movimentada ou o quê for), tanto para verem os outros, como para serem vistos. É uma prática em que toda a comunidade comparece e desta forma constroem, ou mantém, seu status social. E em particular, é como novos casais surgem.

    Durante “la passeggiata”, homens solteiros se arrumam bem e depois ficam desfilando no centro da praça, buscando se destacar e atrair pretendentes. As mulheres ficam nas beiradas observando estes homens, e quando uma delas está muito interessada em um deles, pede para algum conhecido apresentá-los um ao outro.

    E foi em uma dessas passeggiatas, que uma jovem vendedora de vestidos viu um aprendiz de alfaiate muito bem arrumado, e pediu para conhecê-lo. Anos mais tarde, já casados, eles se mudaram para os EUA, e tiveram então um bambino, que chamaram Gay Talese.

    Interessante como na Itália, não só é normal, mas é incentivado que homens se vistam bem e busquem se destacar, não? Você acha que o mesmo acontece onde você mora? E qual é o resultado dessa diferença cultural?

  • Roupa de ficar em casa

    Roupa de ficar em casa

    Se tem um hábito bem ruim que muitos de nós desenvolvemos ao longo do tempo, é o de ficar largado em casa. O clichê do cara usando uma regata velha (e manchada de suor) e uma cueca (talvez furada) no sofá de casa é verdade pra muitos de nós homens, infelizmente. Mas se você se vestir é um ato de consideração aos outros, você não tá cometendo um erro aí?

    Pense: mesmo que ninguém mais te veja, a pessoa mais importante do mundo ainda vai te ver ─ você mesmo. Ao menos de vez em quando, passando pelo espelho do banheiro, ou de manhã, quando estiver se vestindo. Você vai apresentar pra si essa imagem tosca?

    Sem falar que seu inconsciente pega isso: vai ficar no fundo da sua mente que você tá largado. E isso vai virando sua identidade pra si mesmo ─ o cara largado. Você começa a acreditar que você é assim. E depois quando sair e ver outras pessoas, isso vai te afetar. Quando você finalmente decidir se vestir direito, vai se sentir estranho, como se não fosse você mesmo.

    É claro que não precisa ir pro outro extremo e ficar engravatado em casa (mas nada contra se você preferir isso também). Mas pelo menos se vista como se fosse na casa de um amigo.

    Você tem uma calça ou outra mais antiga, que não tá tão legal pra sair de noite ou trabalhar, mas ainda te serve bem e tá bonita? Veste essa. Coloca uma camiseta básica, ou uma polo também, nada demais, mas algo simples e decente. Pronto. Sem complicação.

    Você pode ficar confortável, mas ao menos arrumado o bastante pra ver gente. Porque você é gente afinal, e você vai se ver.

  • Ocasião

    Ocasião

    Estava conversando com um amigo uns tempos atrás, e o papo acabou indo pra roupas e aparência. Nessa ele falou uma frase que gostei bastante:

    Minha ocasião é sair de casa.

    Eu até falei pra ele “cara, vou roubar essa”. Porque é uma frase que carrega muita sabedoria.

    Me diga, você já se perguntou porque chamamos certas roupas de “roupa social”? É porque elas são feitas pra serem usadas em sociedade. Em outras palavras, quando você estiver na presença de gente de fora de casa. É até um sinal de consideração aos outros. As pessoas antigamente tinham essa ideia: você tá socializando, e isso é algo importante por si só.

    Hoje em dia nossa cultura tem essa noção besta de quê precisa de uma razão maior para se arrumar. Isso afeta especialmente nós homens (mas não exclusivamente). Muitos de nós ficam até com medo de estarem arrumados demais. E aí nossas roupas legais ficam lá, guardando mofo no armário. Mas suas roupas não vão durar para sempre. E nem você também.

    Além do mais, nem sempre sabemos quando vai ser um dia especial — grande parte das vezes não temos a mínima ideia. Não imaginamos que hoje vai aparecer uma oportunidade única. Que você vai cruzar com alguém interessante no metrô e a maneira que se vestiu chamou a atenção desta pessoa. Ou que um amigo vai te apresentar um contato profissional muito importante. As possibilidades são enormes, mas se não estiver preparado nunca vai aproveitar nenhuma.

    Então, esquece essa ideia de que precisa de uma desculpa pra usar suas roupas legais. Siga o exemplo do meu amigo. Você vai sair? Tá aí sua ocasião. Até se ficar em casa pode usar também — vai se sentir melhor, afinal.

    Todo dia pode ser uma ocasião, se você quiser.

  • Mas você gosta?

    Mas você gosta?

    Estava ajudando um cliente outro dia a escolher uma bolsa carteiro, pra ele usar no trabalho. Ele achou alguns modelos bem legais, e no final ficou entre duas bolsas:

    • A primeira era uma marrom quase cinza, bem escura e bem discreta.
    • A segunda era num marrom marmorizado, um pouco mais chamativa.

    Ele pensou (corretamente) que a primeira seria mais fácil de combinar com qualquer coisa. Mas…

    Ele claramente tinha gostado muito mais da segunda opção. Só que aí ele ficou com o pé atrás de pegar esta, porque não era a bolsa “ideal” em versatilidade que a outra era. Eu percebi o quê tava acontecendo e falei pra ele:

    “Cara, tem que levar em consideração o seu gosto pessoal. Melhor que ficar caçando uma coisa ‘ideal’ — mas que você não curte tanto assim — pega uma coisa que tá ‘okay’ e que você gosta bastante, e aí você vai usar muito mais e com mais vontade.”

    Ele riu e me deu razão.

    Essa situação ilustra um ponto que quero fazer hoje:

    Você tem que gostar das suas roupas.

    É importante que você goste de suas roupas e da sua imagem, pelo simples fato de que você vai transmitir isto, mesmo sem perceber. Você já deve ter passado por alguma situação em que, ou teve usar roupas que não queria, ou se vestiu sem pensar e depois ficou se sentindo desconfortável. Se pensar nessas situações, vai provavelmente perceber que seu desconforto era visível e que você ficou muito sem jeito pra tudo, só por conta de se sentir mal vestido.

    Então seu gosto é algo que deve ser considerado. Mas é importante salientar que esta não deve ser a primeira consideração, que é o erro que muitos homens cometem hoje em dia. Se vestir só pelo que gosta tende a ser uma péssima ideia. É como falar só em Francês quando você mora na Coréia do Sul, porque você gosta do idioma. Você vai ficar conversando sozinho 99% do tempo.

    Por isso costumo falar sobre suas roupas serem adequadas ao contexto onde você vai usá-las. Essa é a prioridade. Então não use seu gosto como desculpa pra fugir de certas roupas (até porque, nosso gosto é bem mais maleável do quê costumamos considerar).

    Voltando ao exemplo da bolsa: o camarada em questão trabalha de roupa social, pois já percebeu que vestido assim os clientes o respeitam mais e fica mais fácil na hora de fechar negócio e negociar valores. Ele percebeu também que usar mochila não combina com essas roupas, então está buscando uma bolsa carteiro — algo adequado ao contexto. Depois disso, aí devemos considerar o gosto dele.

    Então uma maneira prática de pensar é que, enquanto o contexto onde você vai usar as roupas te diz quais são as opções, o seu gosto serve pra decidir quais destas opções você vai escolher.