Category: Filosofia do vestir

  • Imagem instintiva e imagem cultural

    Imagem instintiva e imagem cultural

    Graças ao nosso pai e ao nosso tio, meu irmão e eu crescemos escutando muito rock progressivo. Pink Floyd, Genesis, Yes, e outras bandas clássicas do gênero: isso é o quê rolava lá em casa quando éramos crianças. E até hoje gostamos bastante, então as reuniões de família podem ter uma trilha sonora bem psicodélica.

    E tem um negócio bem interessante sobre a banda Yes: se você pegar as letras de muitas das músicas, elas… não fazem lá muito sentido. “Chame de manhã dirigindo através do som e dentro e fora do vale”¹? Escutando isso com pela primeira vez você pode pensar “o cara que escreveu as letras tava muuuiiito louco…”.

    Mas, por incrível que pareça, as letras não são assim por acidente (ou muitas drogas). O quê o vocalista fez foi tratar a voz como só mais um instrumento, então ele priorizou a sonoridade das palavras ao invés do sentido delas. Até fez um esforço pra de vez em quando ter algum sentido, mas a sensação que você tem quando escuta a música era mais importante.

    Agora, essa é uma boa analogia prum jogo interessante que rola na nossa imagem: o jogo entre impressões instintivas e significados culturais.

    Analisando roupas masculinas ao redor do mundo e ao longo da história, você vai ver certos padrões. Seja no Japão feudal, na Roma antiga, ou em Buenos Aires atualmente, tem certos motivos estéticos comuns. Um dos mais óbvios, e que vou usar aqui pra explicar a ideia, é que em toda cultura homens buscam chamar atenção pros ombros e costas. Procuram fazer parecerem maiores, ou ao menos mais fortes.

    Isso não é porque há 10.000 anos atrás, toda a humanidade se reuniu e concordou que “essa silhueta é bem legal mesmo”. É algo mais primitivo que isso: seres humanos tem instintos estéticos. E entre estes instintos, existe o de reconhecer homens com ombros e costas fortes como sendo melhores nas coisas que eles sempre fizeram pra garantir a sobrevivência da espécie. Estes homens são portanto, mais vantajosos de se associar e mais importantes de respeitar. Daí em parte, vem nosso conceito de beleza masculina.

    Na analogia da música, isso é o aspecto da sonoridade das letras: algo que mexe conosco instintivamente, independente de entendermos ou não o quê está sendo dito. A pessoa pode não entender as palavras, mas vai pegar que você tá bravo quando gritar um palavrão. E você pode não saber muito sobre a cultura Maori, mas se ver um guerreiro tatuado desde o rosto até o pé, você sabe que é um cara com quem não quer arrumar briga.

    Mas aí entra o segundo aspecto: o significado cultural. Assim como palavras transmitem ideias quando você entende o idioma, certas coisas da nossa imagem só fazem sentido se você sabe o contexto cultural. Um dos exemplos mais óbvios é a gravata: fora do contexto, é uma forca de seda no seu pescoço. Mas no contexto, isso comunica profissionalismo, seriedade, status, classe, etc.

    E o importante de notar nestes dois aspectos, é que o instintivo, enquanto universal, só transmite ideias mais básicas e rudimentares — é bem cru. O significado cultural, porém, pode transmitir ideias complexas e comunicar de forma mais sutil. Também funciona como um código, que só os iniciados pegam.

    Então você pode pensar na sua imagem dentro dessa dualidade: o quê fala de forma simples, pra todo mundo entender, e o quê fala em código, que é mais pro seu povo e transmite ideias mais profundas. Mas lembre-se que você sempre está falando algo.

    ¹Roundabout, do álbum Fragile, (e também do encerramento de JoJo’s Bizarre Adventure)

  • O caminho

    O caminho

    O Caminho do guerreiro não inclui outros Caminhos, como o Confucionismo, Budismo, certas tradições, conquistas artísticas e dança. Mas mesmo estes não sendo parte do Caminho, se você conhecer o Caminho amplamente, você o verá em tudo.

    Miyamoto Musashi, O Livro dos Cinco Anéis

    Muitas vezes falo de assuntos que não são diretamente ligados a imagem ou roupas. Coisas como estabelecimento de hábitos, princípios matemáticos, padrões psicológicos, ou filmes do Stallone.

    Considerando o tema deste blog, isso pode soar engraçado. Mas eu tenho duas ótimas razões para isso, e acho que explicá-las pode te ajudar também.

    A primeira, é que pessoas diferentes vão entender as mesmas ideias de formas diferente. Então eu uso diversas analogias, como me referir às suas roupas como ferramentas, ou cabines de aviões. Minha função aqui é te ajudar, e só posso fazer isso se você entender o quê falo. Então vou falar de tudo quanto é jeito pra você entender.

    A segunda razão, é que através de analogias conseguimos novas ideias e perspectivas. Muito do quê sei sobre me vestir eu fui tirando de outras fontes que não tinham nada a ver com o assunto¹. E tenho certeza que você já teve essa experiência também, aprendendo um instrumento musical, uma nova profissão, um esporte novo, etc. Você relacionou o negócio que estava aprendendo a alguma outra coisa na sua vida e conseguiu melhorar desta forma.
    ¹ sem brincadeira, uma quantidade surpreendente do meu conhecimento veio de videogames

    Então pense no ensinamento de Musashi: O quê você pode usar de outras áreas da sua vida pra entender e melhorar sua imagem?
    E o contrário também: O quê aprendeu sobre sua imagem que pode aplicar no resto da sua vida?

    Veja o Caminho em tudo.

  • Estética é importante

    Estética é importante

    Tem uma coisa engraçada em algumas culturas como a nossa. Essa noção de que estética é algo… Inferior. “Superficial”. Isso é expresso por frases como “não devemos julgar pelas aparências” (como se nosso inconsciente e instintos tivessem essa escolha), que “o importante é o quê está por dentro” (ignorando que o externo é em grande parte uma expressão do interno), e outros clichês, que se traduzem todos em: ignore o quê seus olhos vêem.

    Isso é um grande erro.

    Eu sei, o quê estou falando vai contra muito do quê é pregado pela cultura, e entendo que isso às vezes tem boas intenções. Mas basta uma hipérbole para vermos o quão falsa é essa ideia de quê devemos ignorar a informação visual.

    Imagine um leão. Vivo e saudável, no seu quarto, com você dentro. Ele está encarando e lambendo os beiços.

    Eu não preciso te explicar que isso não é um prospecto legal. Mas por quê? Como você chegou à conclusão de quê o leão é um perigo?

    Bem, você conhece a forma de um leão. Você sabe que ele tem esse tamanho assim, e uma juba, e esse focinho, e as quatro patas. Essa informação visual é relacionada a certos instintos e conhecimentos que possuímos. Isso tudo te informa que esse bichano super-desenvolvido é terrivelmente perigoso pra você.

    Então sim, o quê vemos é importante. Muito importante. É um dos 5 sentidos externos que usamos para conhecer o mundo e nos guiar através dele. Inclusive, é o sentido do qual a grande maioria da humanidade mais depende.

    Imagina se alguém te falasse que sons são algo superficial, e você é idiota por gostar de música. Ou que o paladar é algo inferior e você tá perdendo seu tempo degustando comida boa. Por que então tratar a visão de forma diferente?

  • Tratamento diferenciado

    Tratamento diferenciado

    Hoje vou compartilhar uma história pra explicar um pouco minha abordagem prática no que diz respeito à imagem.

    Há alguns meses atrás, foi o Dia dos Pais. Estávamos eu e meu irmão almoçando com nosso pai e nossa mãe, e em determinado momento o assunto foi indo pra direção de “como as pessoas te tratam por conta de como você está vestido”.

    Meu irmão é músico, e uns tempos atrás tinha passado numa rua em São Paulo famosa por lojas de instrumentos musicais. Junto foi um amigo dele, vestido com roupa de trabalho, que no caso era algo bem “roupa de bater”, como dizem.

    O quê aconteceu foi que eles passaram em várias lojas, onde os vendedores não davam a menor atenção pros dois. Ninguém fazia questão de atendê-los. Em contrapartida, eles viram alguns camaradas sendo muito bem recebidos. A diferença era que estes estavam mais arrumados.

    Depois de bastante frustração, eles decidiram ir na loja de um conhecido. Eles sabiam que ia ser um pouco mais cara, mas que lá iam ser bem tratados. Meu irmão comprou o quê queria (acho que era um amplificador), e ficou com a história pra contar nesse almoço.

    Agora, podemos ficar falando de como os vendedores foram babacas e deviam ter dado atenção pros dois. Mas…

    A realidade é que muita gente vai te tratar de uma forma ou outra pela sua aparência. É completamente inevitável. Mais do quê isto, grande parte do tempo é inconsciente. Eu e você fazemos o mesmo grande parte do tempo (provavelmente não no nível de babaquice destes vendedores, mas fazemos).

    Por essas eu tenho uma abordagem mais pragmática. Como costumo dizer: reclamar que tá chovendo não faz parar de cair água do céu. Você pode abrir um guarda-chuva, que é a atitude pragmática, ou você vai ficar molhado. A escolha é sua.

  • Sem prescrição

    Sem prescrição

    Eu evito escrever artigos muito prescritivos aqui no blog. Sabe aqueles “10 Sapatos para usar neste Verão”, ou “As melhores marcas de jeans no Brasil”, ou ainda “Os cortes de cabelo de 2020”? Então, esse tipo de artigo.

    Não que eu seja completamente contra esse conteúdo mais “beabá”. Eu sei como nós homens trabalhamos muito bem com guias mais diretas e regras. Então, de vez em quando, ainda vou recomendar uma coisa ou outra. Mas mesmo nestes casos, vou procurar aconselhar de maneira mais geral. Mas acho que é importante explicar o porquê desta atitude. E tenho 4 razões muito boas:

    1. Este tipo de conselho já tem até em excesso na internet. Verdade que a maioria é de qualidade… duvidosa. Mas também tem coisas boas por aí. E tem livros também, que é algo que recomendo muito mais. De qualquer maneira, não acho que eu tenho muito de novo pra acrescentar nessa linha.
    2. Grande parte desse conteúdo, daqui 1 ou 2 anos fica defasado. E não vejo valor em te passar um conhecimento com data de validade.
    3. Conselhos prescritivos funcionam muito melhor pessoalmente. Não querendo fazer ninguém se sentir o floquinho de neve mais especial do mundo, mas somos todos diferentes a ponto que este tipo de coisa vai funcionar melhor quando individualizada (essa razão pesa bem mais que as anteriores).
    4. E por último, conselhos prescritivos, enquanto úteis de vez em quando, tendem a gerar dependência. Se você precisa de mim (ou outros) pra te dizer o quê comprar e vestir, a verdade é que nunca vai aprender a se virar por conta. Uma hora tem que tirar as rodinhas da bicicleta.

    Por estas razões, minha proposta pra você é de explicar mais o pensamento por trás do vestir: porque isso ou aquilo é vantajoso (ou não); porque usamos roupas do jeito que usamos; o quê é útil considerar quando você vai às compras. A meta aqui é a mesma das minhas consultorias: de que um dia você não precise mais de mim. Que você seja independente.

    E aí, quem sabe? Talvez um dia seja você ajudando outros caras a melhorar a imagem.