Author: vinicius.b.gennari

  • Cuidando das roupas: conforto vs durabilidade

    Cuidando das roupas: conforto vs durabilidade

    Conversando com minha professora de consultoria outro dia, lembrei da história que ela contava de quando trabalhou em uma marca de alfaiataria bem famosa (cujo nome não vou revelar¹)…

    Como muita marca de alfaiataria hoje em dia, eles vendem bastante pra noivos e homens que vão num casamento no geral (porque a maioria dos caras tá despreparado). E o clima do Brasil no geral sendo como é — sem falar que muita gente gosta de fazer casamento em lugares quentes — o quê acontecia é que muitos destes homens escolhiam ternos costumes mais finos, feitos com tecido mais leve e com número “super” maior, como super160.

    Juntando a isso, ela trabalhou nessa marca na época que a moda tava bem “slim fit”, que é só um nome que inventaram pra roupa justa. Então o quê rolava era:

    • Noivo escolhia o costume;
    • Fazia questão de que fosse bem fino (leu na internet que “número super alto é o melhor!”);
    • Fazia questão que fosse “slim fit” (“é o quê tá na moda!”);
    • Cerimônia ia okay, apesar das roupas justas;
    • Noivo chega na festa, cumprimenta todo mundo;
    • “Opa, bora tomar umas pra comemorar”;
    • Noivo começa a dançar;
    • E… o tecido da calça rasga da forma mais constrangedora possível e estraga a diversão dele (e deixa a noiva muito puta!).

    Eu lembro que perguntei “Mas por quê raios vocês não falavam pros caras isso?!” quando escutei a história.

    “A gente falava, mas eles não escutavam! ‘Porque super160 é mais confortável’ e eles ‘nem vão usar muito a roupa mesmo’…”, ela respondeu. Então a marca acabava tendo que reformar ou trocar as calças de muita gente (isso quando não era pior e não rasgava nas costas do casaco).

    Quando você escolhe uma roupa, sabendo ou não, você está fazendo uma escolha de quanto conforto você vai sacrificar por maior durabilidade. Roupas mais leves são mais confortáveis no geral, mas por logicamente são menos resistentes.

    Isso se aplica de maneiras mais óbvias: Tecidos grosseiros como o denim² do jeans são bem “duros” e restringem seu movimento, mas são feitos pra durar.

    Mas também se aplica de maneiras menos óbvias: Tecidos feitos de poliéster tem mais elasticidade que os de algodão, mas não absorvem umidade e não fazem boa troca térmica (na prática: você derrete no calor e congela no inverno).

    Adicionando a isto tem a questão do valor: uma calça de lã fria vai sair mais cara que uma de sarja de algodão e bem mais que uma de microfibra, mas vai ser absurdamente mais confortável que as duas.

    Então qual é a solução aqui? Bem, não existe uma resposta simples. Vai depender de roupa pra roupa, do uso desta, do seu estilo de vida, do cuidado que você toma, etc. Como muita coisa nesse jogo da imagem, é mais uma questão de você ter consciência do quê está fazendo pra tomar uma decisão melhor pra você.

    ¹Não que ela tivesse algo de ruim a falar da marca e seu dono: só tinha elogios na verdade. Não falo por questão de decoro mesmo.

    ²Essa é a razão original do jeans, aliás: apesar de bem menos confortável que uma calça feita em tecido de lã, quando você trabalha numa mina de carvão ou é estivador, você precisa de algo que resista acidentes e muitas lavagens.

  • Casualização sartorial

    Casualização sartorial

    Um negócio interessante que notei de meados dos anos 2000 pra hoje é a irônica contradição do vestir masculino. Você vê, cada vez menos temos a obrigação social de usar roupas formais ou de alfaiataria (que não são a mesma coisa, aliás). O vestuário masculino está cada vez mais flexível e sem regras: a maior parte de nós pode vestir quase o quê quiser no dia-a-dia. Com a mudança de muitos para o trabalho home office, isso se torna uma tendência ainda mais forte. Porém…

    Uma boa parte de nós decidiu usar alfaiataria. Uma quantidade grande de homens (em particular das duas gerações mais novas) escolhe usar “roupa social”, sem obrigação nenhuma. Apesar dos incontáveis artigos declarando “a morte do costume” (só procurar na internet que vai encontrar), eventos como Pitti Uomo crescem ano a ano, blogs como este e tantos outros surgem, e as vendas de roupas de alfaiataria masculina continuam firmes e fortes. Por quê esta aparente contradição?

    Falando pela minha experiência e o quê notei vindo de amigos e clientes: agora que não somos forçados a colocar terno costume e gravata, estamos encarando estas peças com um olhar menos tendencioso. Não existe mais uma aversão a usar estas roupas que tínhamos quando elas eram forçadas socialmente, então podemos vê-las e avaliá-las com a mente aberta. Somos como crianças cujos pais queriam forçar a fazer alguma coisa, até que em determinado momento eles desistiram… e aí fomos e fizemos a coisa por vontade própria. Você não queria comer alface porque sua mãe tava te forçando. mas agora que ela parou, “Hey, até que a textura é boa! E fica bom com sal e limão!”.

    Então o quê vemos são duas gerações onde usar estas roupas se tornou uma escolha consciente. Eu posso ir no bar e encontrar um amigo que vestiu uma gravata e um colete DEPOIS que saiu do serviço, porque ele curte o visual. Chego na festa e um camarada tá usando suspensório porque achou legal quando viu num filme e comprou um pra experimentar.

    Roupas de alfaiataria deixaram de ser uma imposição de se conformar ao resto da sociedade, e voltaram a ser o quê eram há muito tempo atrás: uma forma de expressão pessoal.

    E eu acho isso muito legal!

  • O prazer de vestir

    O prazer de vestir

    Semana passada eu comentei de como homens sempre se importaram com a própria aparência, e toquei no assunto de que, apesar do quê dizem, forma nem sempre segue função nas roupas masculinas. Isso é mais uma questão de “contrastando com roupas femininas, roupas masculinas são funcionais“. Mas olhando bem, tem muita coisa no nosso guarda-roupas que não tem nenhuma razão prática, como:

    • Gravatas (obviamente);
    • Lenços de bolso (na maior parte das vezes; alguém pode decidir usar pra limpar o suor — ou pior);
    • Relógios, numa era em que todo mundo anda com celular (se for de bolso então…);
    • Vários acessórios, como colares, pulseiras, anéis, etc.

    E além de peças individuais, tem detalhes e escolhas que fazemos que não são nada práticas. Usar sapatos com sola de couro em algum lugar onde chove com frequência (e ter que carregar galochas por isso), fazer questão de camisas costuradas à mão (sendo que uma máquina poderia ter feito o mesmo trabalho), escolher um forro detalhado e bonito pro seu casaco (sendo que só você vai vê-lo), gravatas de luxo feitas exclusivamente de tecido e sem nenhum enchimento (as chamadas 7 dobras), e por aí vai.

    E mesmo assim fazemos esse tipo de coisa, né? Por quê?

    É algo normal em qualquer hobby masculino: curtir carros antigos pela artisticidade da coisa, pela dedicação de quem fez e pelas formas clássicas. Pegamos gosto pela arte da coisa, pela dedicação e perícia de quem fez. Dá pra explicar de várias formas, mas no fim do dia, é um certo romanticismo.

    A ideia de decidir usar algo que você sabe que não tem utilidade, especialmente se como no caso do forro ou da camisa costurada à mão, que ninguém vai realmente saber, só você. É um prazer de se vestir bem e de cuidar de si mesmo. O prazer de usar algo que foi feito com dedicação, com detalhes especiais

    E não tem nada de errado nisso.

  • Homens sempre se importaram

    Homens sempre se importaram

    De vez em quando fico surpreso que tem muito sujeito que ainda tem aquela noção ultrapassada de que não pode admitir que se importa com a própria aparência, porque isso “não é coisa de homem“. Escuto alguma conversa ou esbarro em algo online e lembro que tem caras que ainda pensam isso.

    Mas sabe de algo irônico? Historicamente, homens sempre se preocuparam mais com a própria aparência do quê mulheres.

    Soa estranho, mas é verdade: estudando a história da indumentária ao redor do mundo¹, você vê por exemplo, que em todas as culturas homens sempre são os primeiros a adotar novas formas de se vestir. Você pode ver isso também hoje em dia em subculturas, que quase sempre são iniciadas por homens e depois adotadas por mulheres.

    Uma das razões disso é o fato de quê homens sempre foram mais propensos a viajar e explorar, e por consequência lidar com pessoas de fora da própria comunidade. Por isso também, transmitir mensagens não verbais sempre foi algo muito importante: eu posso não entender a língua dessa tribo que acabei de conhecer, mas se um dos caras tem um colar de dentes de urso e veste a pele do bicho, algo me diz que é melhor respeitar o sujeito.

    Outra questão é que o quê homens buscam comunicar com suas roupas não é tanto atratividade e beleza (isso tende a ser como mulheres se apresentam), mas mais competência e poder. Se prestar atenção nas roupas de homens de diferentes culturas, notará que grande parte das vezes, elas buscam projetar uma imagem imponente.

    Isso explica a tendência mundial de homens realçarem seus ombros, por exemplo. Desde um kamishimo no período sengoku do Japão, passando por epaulettes nos uniformes militares franceses do século XVII, até chegar nas jaquetas de couro de membros de clubes de moto, todos realçam a massa na parte superior do corpo. Também é a razão de muito do guarda-roupa masculino ter sua origem em roupas militares, de caça ou de trabalho. Dando três exemplos próximos aqui:

    • O famoso trench coat surgiu como um sobretudo militar (o nome é literalmente casaco de trincheira) antes de ser adaptado à vida civil.
    • A jaqueta Norfolk era uma roupa usada em caçadas, mas encontrou um caminho como jaqueta casual na vida urbana.
    • E o jeans, famosamente, surgiu como uma calça para trabalhadores braçais (mineiros e estivadores, primariamente), antes de ser adotado pelo resto da sociedade.

    E ao contrário do que muitos dizem por aí, roupas masculinas não necessariamente eram puramente funcionais também. Procure imagens de armaduras e notará que tem alguns detalhes puramente decorativos, que não servem nenhuma função prática, mas eles comunicam algo. Ou veja quadros da corte francesa do século XVII, e note a opulência.

    Enquanto alguns caras hoje em dia vivem no conforto do século XXI e falam que se importar com a aparência “não é coisa de homem“, os antepassados destes, que muitas vezes mataram e morreram literalmente, tinham uma atitude diferente. Interessante pensar nisso, né?

    ¹ Se quiser conhecer mais, recomendo o livro A História Mundial da Roupa, de Patricia Anawalt.

  • Se tornando referência

    Se tornando referência

    Conversando com um cliente outro dia, entramos num assunto interessante, que era a percepção e a reação de outros homens sobre sua imagem, particularmente como essa reação vai mudando conforme você começa a investir em melhorar.

    Segundo ele contou, no começo do processo de se vestir melhor, os colegas de trabalho e amigos fizeram piada com ele, por abertamente se preocupar com a própria aparência e por estar mudando. Esse é sempre o primeiro estágio, onde outros homens zoam com você por estar mais arrumado.

    Mas depois de algum tempo as brincadeiras pararam e ele percebeu que os outros sujeitos pareciam um pouco intimidados agora. E de repetente estavam se arrumando um pouco mais pra ir trabalhar ou quando iam encontrar com ele. Esse é o segundo estágio, onde o fato de você estar mais arrumado gera um pouco de desconforto, pois os outros homens acabam percebendo que eles estão largados em comparação.

    E aí chegou um ponto em que eles começaram a brincar de novo, mas desta vez era diferente: eles tratavam ele como “o cara do estilo”. Eles faziam piada que ele era o sujeito mais elegante e começaram a pedir conselhos pra ele de como escolher, comprar e combinar roupas. As namoradas dos amigos começaram a pedir pra ele ajudar os companheiros também.

    Escutando a história, eu pensei e ri internamente “Yup. É sempre assim mesmo.”.

    Quando você se destaca, quando começa a melhorar em qualquer coisa na vida, no começo gera um desconforto pra quem te conhece — leva um tempo até as pessoas se adaptarem. Mas passado este tempo, o que acaba acontecendo é que você passa a ser mais respeitado e vira a referência pra quem é do seu convívio.

    E com a sua melhora, você acaba incentivando os outros a melhorar também.